Treino seco: do limão uma limonada em tempos de pandemia

Por Luiz Eduardo Dias

O ano de 2020 foi muito difícil para todos nós que gostamos de praticar este maravilhoso e saudável esporte que é o tiro ao voo. Não só pela redução do número de campeonatos, mas também pela quase ausência de provas presenciais, como as regionais. As provas presencias são muito importantes para exercitarmos uma parte fundamental e igualmente prazerosa do tiro esportivo: encontrar amigos e parceiros de esporte. Obviamente que, para muitos, a dor certamente foi imensuravelmente maior pela perda de pessoas queridas e de parentes. 

No início deste ano, quando pensávamos que tudo voltaria à normalidade, incluindo, é claro,  as nossas vidas,  fomos surpreendidos por uma nova onda da pandemia. Portanto, é evidente que vamos ter que aprender a viver o “novo normal”. 

Os clubes do Brasil ( a grande maioria deles) se encontram fechados para treinos e provas durante esta segunda onda. Apesar de ser muito “chato” não poder frequentar os clubes, nem tudo está perdido em termos de preparação física, técnica e psicológica para manter o corpo e a mente ativos e focados em obter bons resultados. O tempo que não pode ser desfrutado no clube, pode ser aproveitado para a melhorar a preparação física e mental, praticando o tiro a seco, associado a uma rotina de exercícios físicos, alongamentos e fortalecimento muscular, inclusive dos olhos.

Treino Seco – O tiro a seco 

Treinar o tiro a seco é uma grande oportunidade para manter a memória muscular ativa e checar se a empunhadura está correta para uma visada perfeita. Entenda empunhadura em seu sentido mais amplo, ou seja, incluindo o movimento de elevar a arma e colocá-la corretamente no ombro (montar a arma a partir de uma tradução livre do inglês “monting”). O treino seco pode ser dividido em duas etapas.

Etapa 1 — Treinando a empunhadura

O ideal é ter um espelho grande onde o atleta possa estar afastado três metros. Caso não tenha um espelho onde se possa afastar por três metros, uma parede lisa também resolve. A vantagem do espelho é poder observar se a visada está correta — posição do olho em relação à varilha (fita) e massa de mira. No espelho coloque um X com fita adesiva colorida mais ou menos na altura que o cano da arma fica do solo quando se chama o prato. A uma distância de três metros, a casa da máquina pode ser simulada com uma fita adesiva de 65 cm de largura por 150 cm de altura. Se você atira por tempo, o X vai estar acima de 140 cm de altura e se você atira por modo, o X pode ser colocado um pouco abaixo de 140 cm de altura. Treinar a colocação da arma na posição correta em sequências de 10 repetições. Repetir as sequências por cinco vezes. 

Etapa 2 — Swing 

Para treinar a movimentação do tronco em busca do prato (swing), o ideal é que se tenha uma parede lisa onde se possa colocar uma fita adesiva colorida simulando a casa da máquina. No caso do Trap Americano, a fita deve ter 65 cm de comprimento e deve ser colocada a 140 cm de altura do chão. Acima da fita adesiva coloque vários X (pelo menos cinco) em posições que simulem mais ou menos os pontos de quebra de pratos. Pratos retos e laterais respeitando a angulação da disciplina (17 a 21o). Após empunhar a arma corretamente, chame o prato e movimente a arma até um dos X na parede e dispare;  é saudável sempre verificar se a arma não está carregada.  Repita o processo por no mínimo 25 vezes alternando sempre o ponto de disparo (X).

Para treino seco na modalidade Skeet, as fitas (duas) podem ser colocada de fora a fora na parede (ideal é que tenham pelo menos 300 cm de comprimento). Uma deve ser fixada na altura de lançamento da casa alta e outra na altura da casa baixa. Os Xs devem ser colocados nos pontos de quebra de single e de double.

Para quem deseja algo mais dinâmico, existem equipamentos que simulam o lançamento de pratos por meio do uso de filmes projetados em uma tela, por meio de um data show, como um vídeo game. Um exemplo é o DryFire (https://wordcraft.com/dryfire) fabricado pela Wordcraft. Entre diferentes modelos, o mais completo simula várias disciplinas de tiro ao voo e fornece resultados de cada tiro quanto à posição da dispersão de chumbos e a distância em relação ao ponto de quebra do prato. O custo do parelho gira entorno de R$8.500,00, na Inglaterra.

Exercitando a concentração e o foco

O primeiro passo para melhorar o lado psicológico do tiro é trabalhar o mindsetcorreto. Retirar pensamentos e mensagens negativas do cérebro faz grande diferença no comportamento do atleta, principalmente sob o estresse de uma competição. Reforçar os bons resultados positivos e melhorar a autoestima são fundamentais. Para quem tem o salutar hábito de anotar seus resultados de treinos e competições em uma planilha, fica mais fácil rever os scores obtidos e colocar metas para serem alcançadas. Trabalhar estes dados ajudam a manter o foco na melhoria de resultados, procurando, sempre, reforçar aspectos positivos. Se o atleta fez uma série boa e a seguinte não foi tão boa, refletir sobre a razão da alternância de resultados é importante, porém o foco principal deve ser dado ao bom resultado — e não ao outro. Procurar manter a mente positiva e focada para as boas sensações decorrentes de bons resultados não pode ser preterida pela sensação de fracasso. A simulação mental de pulverizar os pratos e de terminar uma série perfeita, deve ser preservada na memória, para que sempre esteja disponível quando for necessária. Para isto, treinar a mente é importante. Ao invés de reclamar e se lamentar o prato perdido, é necessário manter viva a imagem e a boa sensação dos outros 24 acertos. Desta maneira, reforça-se o aspecto positivo e não o negativo.

Uma boa preparação física — além de práticas que visem obter maior resistência aeróbica, como caminhadas, corridas e pedaladas de bike, entre outras —, deve abranger os tradicionais exercícios para ganhar e/ou manter massa muscular. Por se tratar de um esporte que pode ser praticado de maneira competitiva por muitos anos, minimizar a perda de massa muscular com a idade é muito importante. Da mesma forma, exercícios que promovam o alongamento muscular devem fazer parte da rotina de treinamentos. O alongamento muscular do tórax e do quadril, por exemplo, é importante para manter boa postura de tiro e facilitar a movimentação lateral (swing). Aliás, manter boa mobilidade de quadril é também fundamental para evitar dores lombares, muito comum em atiradores esportivos.

Por falar em musculatura, nossos olhos possuem músculos que são responsáveis pela sua movimentação. Exercitar estes músculos trazem benefício para a rápida movimentação destes em busca de alvos móveis. Na internet, podem ser obtidos Apps (Eye Exerciser, Apple Store) e kits (Ed Lyons Sports Vision Training Kits:www.ed-lyons.com/eyewear-shop)  que são utilizados para exercitar a movimentação dos olhos e assim ajudar na performance do atleta. 

É evidente que nenhuma das práticas citadas substitui 100% do treinamento real no clube de tiro. Entretanto, a impossibilidade de acesso ao clube não pode ser vista como determinante para perder o foco e a memória muscular do tiro — e muito menos a forma física; se bem que manter o peso durante a quarentena tem sido um hercúleo desafio. Enfim, existem alternativas para manter a chama do tiro esportivo acesa. “Bora” fazer uma limonada!

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